O entusiasmo com os filmes de Star Wars, ainda na década de 80, garantiu a Vicente Martin Mastrocola o apelido de Vince Vader que, mesmo aos 43 anos e em sua função como professor na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), faz questão de adicionar o apelido à sua apresentação. Sua formação acadêmica é extensa, Vince fez graduação e pós-graduação em Publicidade e Propaganda, seu mestrado e doutorado foram sobre Comunicação e Práticas de Consumo, tudo isso feito na própria ESPM. Vince também realizou doutorado e pós-doutorado sanduíche em uma instituição de ensino da Eslováquia.
À primeira vista, esse extenso currículo pode ser interpretado como um arsenal intelectual de um grande estudioso apaixonado pela área de Publicidade e Propaganda. O que não deixa de ser verdade. No entanto, Vince Vader se destaca no mercado como Designer de Jogos. “Na época [em que fiz minha graduação] não tinha faculdade de jogos como tem hoje, a coisa mais próxima era Publicidade”, explica o professor e produtor de jogos.
Voltando no tempo, a paixão pelos jogos veio desde a infância, especialmente os videogames. Quando pequeno, Vince ganhou um console de seus pais: o Atari 2600, e seu encantamento pelos jogos começou. “Eu me lembro de olhar para aquilo que acontecia na televisão com fascínio, hoje as crianças já nascem imersas nesse mundo com videogames, internet, iphones, tablets e tal, mas na época era um enigma muito grande sobre entender como tudo aquilo acontecia, era uma coisa quase mágica!”, conta o Vince adulto.
Esse fascínio sobre o funcionamento dos jogos, levou o jovem a começar a pesquisar sobre o processo criativo de produção desse tipo de recreação. E isso não se limitava a uma pesquisa de jogos eletrônicos, Vince queria saber também como funcionavam os jogos analógicos. E foi nessa busca que o jovem de onze anos conheceu o Role-Playing Game (RPG), por meio do “Dungeons & Dragons” (D&D). Em conjunto com um grupo de amigos de sua cidade natal, Catanduva (SP), ele passou a estudar esse jogo em específico, o D&D, e através dele passou a compreender a função das regras e a mecânica dos jogos em geral.
Mais tarde, no fim da década de 90, nas vésperas de escolher um curso de graduação, sem a possibilidade de estudar jogos especificamente, Vince optou por fazer faculdade de Publicidade e Propaganda na ESPM. Ainda como “bixo”, o jovem aspirante a publicitário viu a oportunidade de trabalhar em um site do Terra, o fulano.com.br que tinha uma formatação que permitia a interação dos usuários com a plataforma por meio de jogos. “Apesar de na época ainda não existir essa palavra, o fulano.com.br já era um site gameficado. Você jogava quests de enigma, quizzes, fazia tarefas, ganhava pontos e os trocava por coisas dentro do site, como bonecos e camisetas”, relembra.
Trabalhar neste site foi a porta de entrada para um mercado em que Vince atua até hoje, os advergames. “Foi a primeira vez que dentro de uma mídia digital emergente, em 1999, que começaram a chegar marcas falando: ‘eu quero fazer quizzes da minha marca’ ou ‘quero criar um tipo de enigma’, considerando que isso era para ser feito em uma internet super limitada que basicamente permitia texto e imagem. Então ali eu comecei a fazer os primeiros projetos”, relembra. Mas o que é um advergame? Em poucas palavras, se trata de uma estratégia utilizada pelas marcas para se autopromover usando os jogos como intermédio.
A partir dali, Vince passou a criar diversos jogos para marcas como Fiat, Google, Itaú, Danone, Ford, Vivo, McDonalds, Intel, entre tantas outras. “Sempre aparece um projeto ou outro relativo a marcas, porque isso é uma coisa que aqui no Brasil ainda é muito forte”, explica o professor.
Para Vince, a graduação na área de marketing foi essencial para compreender como vender e popularizar um jogo, uma vez que o trabalho não acaba quando o projeto é finalizado, ele precisa chegar até a mão do consumidor e para isso, as estratégias de publicidade e propaganda são essenciais.
“Eu desenvolvi mais ou menos uns cinco ou seis jogos onde eu coloquei grana do meu bolso, não foi financiamento coletivo. Foi tirado do meu bolso mesmo. E se você perguntar para mim: fez dinheiro com isso? a resposta é não. Pelo contrário, em alguns casos, eu até tive prejuízo, investi uma grana e não recuperei. Mas isso foi em uma época de construção de portfólio. Eu estava tentando fazer meu nome junto a algumas pessoas da área. Então eu acho que nesse ponto, a graduação de Comunicação e graduação de Publicidade e Marketing me ajudou muito”, reflete o professor.
O estudo de Vince na área de Game Design foi feito de maneira “informal”, isso porque de acordo com o professor, os materiais relativos a jogos eram escassos e caros no início de sua carreira. Essa inacessibilidade foi sendo diluída com a rápida evolução da internet e a disponibilização desses materiais de forma digital.
Além dos advergames, Vince se destaca na produção de jogos de tabuleiro para a Grow, uma empresa brasileira que produz e comercializa brinquedos e jogos. Na Grow, Vince foi responsável por fazer duas versões do clássico War: War – Game Of Thrones e War – Vikings. Além disso, ele também fez parte da produção de duas edições do jogo Master e criou o jogo Enigma de Hogwarts Harry Potter.
Além dos jogos para a Grow e de grandes marcas, Vince tem seus jogos independentes, como HÚSZ que reflete a predileção do professor por jogos abstratos que não tem um tema específico e utilizam muito da estética geométrica em sua composição.
“Eu fiz, inclusive, entre 2011 e 2017, uma série de jogos abstratos usando os dados clássicos de rpg, 4, 6, 8, 10, e 20, um jogo para cada dado. Quando eu fiz para a Grow, as edições de War, que são jogos que voltam sempre na mecânica de combate clássica, eles me liberaram para criar regras. Quando dá para misturar esse universo de jogos abstratos com estratégia eu acho bem incrível”, explica o game designer.
Atualmente, Vince concilia sua vida acadêmica como professor em diferentes cursos da ESPM, desenvolvedor de jogos para a Grow e como produtor independente. Ele também é autor de diversos livros, como Ludificador – Um guia de referências para o game designer brasileiro (2012), Doses Lúdicas (2013), Horror Ludens (2014), Game Design: modelos de negócio e processos criativos (2015), Game Cultura: comunicação, entretenimento e educação (2017), Level Hard (2018) e 15 exercícios para criação de jogos (2020).Vince Vader é um case de sucesso no cenário brasileiro de jogos e publicidade, se destacando em ambas as áreas ao ser capaz de combar suas habilidades em diferentes setores para produzir conteúdos de excelência. “É uma coisa que faz parte da minha infância e adolescência. Acho que volta aquela história dos videogames em que eu olhava e pensava ‘nossa, mas como é que isso é feito?’. Trabalhar com jogos é mágico!”, finaliza Vader.