Entre 2023 e 2025, observamos com preocupação o crescente endividamento de pessoas envolvidas em apostas digitais, especialmente por meio de aplicativos móveis que, com seus recursos audiovisuais sofisticados, se assemelham visualmente a jogos digitais.
A língua portuguesa oferece uma vantagem em relação ao inglês nesse campo: temos um verbo específico para a atividade de jogar — jogar — enquanto, em inglês, é preciso especificar o objeto (por exemplo, play a game). No entanto, essa vantagem se desfaz quando percebemos a ausência de um termo claro e específico em português para designar a atividade de se envolver em apostas. O termo inglês gambling expressa precisamente os mecanismos, riscos e características do sistema de apostas, algo que ainda carecemos em nosso idioma.
Historicamente, apostas e jogos foram confundidos no imaginário coletivo, um equívoco reforçado por expressões populares como “fulano perdeu tudo no jogo”. Na maioria das vezes, esse “jogo” não é um jogo no sentido educativo ou recreativo, mas sim uma atividade de cassino ou outra forma de aposta com apelo emocional e envolvimento financeiro — um cenário onde o fator sorte se sobrepõe à habilidade.
Há situações em que um jogo de habilidade, como sinuca ou bilhar, pode estar presente em contextos de aposta. Porém, as perdas não decorrem do jogo em si, mas da introdução externa de valores monetários — algo que não faz parte das regras fundamentais desses jogos, a não ser quando institucionalizados por federações ou entidades esportivas reconhecidas, com regulamentações claras e oficiais.
Esse cenário, em que jogos acabam sendo utilizados como suporte para apostas, exige reflexão e estudo. É necessário compreender como a promessa de recompensa financeira pode manipular emoções, desafiar a autoestima e influenciar comportamentos — seja por ganhos inesperados, por pressão social, ou por estímulos biológicos. Esse é um campo fértil para pesquisadores das áreas de saúde, educação e ciências sociais.
Hoje, sabemos que os jogos são fundamentais para o desenvolvimento humano. Eles promovem a convivência social (Caillois), preservam e expressam a cultura (Huizinga, Bloom), desenvolvem habilidades duradouras (Winnicott, Avedon, Sutton-Smith), aliviam a sobrecarga mental (McGonigal), e se entrelaçam com conceitos essenciais da educação (Vygotsky) e da psicologia do fluxo (Csikszentmihalyi).
Por isso, é urgente envolvermos a sociedade na valorização dos jogos e na distinção clara entre jogar e apostar. Precisamos desfazer anos de confusão e desinformação — que hoje, inclusive, são reforçadas por campanhas publicitárias de empresas de apostas.
Foi com essa motivação que junto à Rede Progressista de Games (RPG), com o apoio da Games for Change Alérica Latina (G4CAL), o portal Drops de Jogos, e outros colaboradores, criamos a campanha “Aposta não é Jogo”, cujo objetivo é conscientizar a população sobre a diferença entre essas duas atividades. A campanha apresenta a mensagem central “Aposta não é Jogo” acompanhada de frases que incentivam a reflexão e o diálogo sobre o tema, sempre com uma moldura que identifica a campanha!
Nosso propósito principal é promover a conscientização. Mas os impactos secundários também são relevantes: queremos estimular hábitos mais saudáveis de lazer e entretenimento, contribuir para uma convivência social mais harmônica e incentivar atitudes financeiras mais responsáveis.
Procure as produções da campanha em nossos colaboradores. As peças estarão nas diversas redes sociais, nas páginas dos idealizadores e, em duas semanas, abriremos para colaboradores externos. Siga-nos no Instagram e nos envie uma mensagem com a intenção de participar que entraremos em contato assim que abrirmos aos colaboradores externos.
Joguemos!
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[…] Rodrigo Domingues do grupo de pesquisas Gamegesis. Entre 2023 e 2025, observamos com preocupação o crescente endividamento de pessoas envolvidas em […]
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