Caminhando de mãos dadas com desenvolvimentos da indústria de jogos eletrônicos, os romances visuais existem desde a concepção dos primeiros consoles, mas seriam esses video jogos?
Diálogos extensivamente longos, frequentes descrições de cenários e emoções, imagens estáticas com uma ou duas variações. Esses são alguns elementos que normalmente não vêm à cabeça quando pensamos em jogos eletrônicos, mas são características comuns em um gênero altamente popular dos jogos virtuais. Os romances visuais, popularmente chamados de visual novels, são um gênero, dos jogos, que focam na exploração narrativa de um conceito, seja esse, um assasinato misterioso, uma casa mal assombrada ou a ideia de namorar seres de outro mundo.
Jogos desta categoria não são novos, pelo contrário, eles existem desde as primeiras interações de jogos eletrônicos, tendo início com o jogo Colossal Cave Adventure, uma aventura em texto nos computadores de mesa, com o estilo evoluindo para sua forma gráfica, que também teve representantes em consoles como o NES e Master System. Mas, mesmo com essa longevidade, muitos podem nunca ter escutado sobre títulos do gênero para essas plataformas. Isso se dá pelo fato do maior público de consumo desse estilo de jogo se localizar no Japão. Assim, no oeste, os romances visuais demoraram a se popularizar e a criar uma base de fãs fiéis, consequentemente, recebendo menos portes e traduções dos jogos que lotam as estantes japonesas.
Histórias fora do papel
“Danganronpa”, uma das franquias de romances virtuais mais populares no japão, hoje vê sucesso no oeste. Fonte: Steam
Como o nome já aponta, os jogos desse gênero tem uma conexão com romances literários. Essa relação se dá principalmente por seu estilo narrativo e tamanho. Romances virtuais são histórias extensas contadas por inúmeras linhas de diálogo e texto, se aproximando do formato de livros, mas um diferencial da sua contraparte de papel é que esses têm uma presença estética muito forte, além do componente interativo oferecendo a possibilidade de escolha.
O quesito visual é um dos principais atrativos e diferenciais do gênero. A direção de arte é frequentemente apontada como um destaque entre um bom romance visual e um ruim, somando isso a quesitos como trilha sonora e design de som, elementos não existentes em leituras de romances tradicionais, é possível delimitar o espaço que separa o gênero das folhas de um livro.
Mas, mesmo com essa delimitação, a categorização das histórias desse gênero ainda são complicadas, afinal, nos últimos anos, com a popularização das narrativas nesse estilo em plataformas de jogos, um questionamento surgiu na comunidade de jogadores: “os romances visuais são realmente jogos ou só histórias interativas?”
Inspirações e revisões
“VA-11 Hall-A: Cyberpunk Bartender Action” se encontra no topo dos jogos de romance visual mais baixados da Steam . Fonte: Steam
Quando se fala em história interativa, um gênero tradicional vem à mente o “choose your own adventure”, ou escolha suas aventuras em português, também conhecido como livro jogo. Esse gênero nasce a partir de uma série de livros de histórias interativas com mesmo nome, nos quais, durante a leitura, o leitor é confrontado com escolhas na narrativa e deve fazer uma decisão. Ao fazê-la, ele deve ir à página anotada e continuar a narrativa por lá. Essa estrutura se popularizou nas vias escritas, chegando a um ponto que se tornou um sub gênero de histórias. Mas como isso se relaciona com romances virtuais?
A mecânica principal nos romances virtuais são as árvores de diálogo, essas que ditam por escolhas feitas pelo jogador, como responder e tratar personagens, ou escolhas específicas em momentos da narrativa. Assim, quando o jogador faz uma escolha, como a de tratar bem ou mal uma personagem, isso afeta diretamente a história, criando caminhos narrativos assim como nos livros citados anteriormente.
Opções de diálogo no controverso jogo “Doki Doki Literature Club”. Fonte: SteamAH
Esse elemento de caminhos divergentes estão presentes na maioria das histórias interativas, sejam essas em mídias escritas, como os livros já citados, ou visuais como os especiais da Netflix: Black Mirror: Bandersnatch; Carmen Sandiego: To Steal or Not to Steal; e Minecraft: Story Mode. Se com os romances virtuais se mantendo só com essas características sua categorização como história interativa ao invés de jogo apresenta discussões, quando eles aplicam elementos de outros gêneros e subgêneros dos jogos, o problema se aprofunda.
Momento em que o romance virtual “Dream Daddy” usa o formato de jogo de pokemon para fazer um de seus mini games. Fonte: Polygon
Desde o uso de puzzles no simulador de namoro Helltaker, ao uso de mecânicas de combate de RPG em Utawarerumono, funcionalidades de jogos aponte e clique em Ace Attorney: Phoenix Wright, ou, por fim, o uso de mini jogos no romance virtual Dream Daddy: A Dad Dating Simulator, mecânicas de jogos dentro do gênero das novelas virtuais aumentam o engajamento do jogador e contextualizam a história experimentada. Mas porque o questionamento da sua validação como jogos surgiu?
O livre acesso à ferramenta do steam greenlight, somado ao formato dos romances virtuais, cujo estilo proporciona produções superficiais e simples, permitiu uma abundância de jogos do gênero a serem publicados na plataforma. Mas esses, cuja maioria foi feita de forma rápida, muitas vezes não contavam com uma árvore de diálogos adequada para ser caracterizada como elemento de jogabilidade, nem com elementos mecânicos extra para proporcionar a jogabilidade adequada. Assim, a imagem pública dos jogos do gênero começou a mudar. Durante esse período os jogos dessa categoria eram muitas vezes considerados fanfics mal escritas com personagens de anime.
Mas essa imagem vem mudando. Muitos jogos do gênero vêm assumindo um espaço na cultura e na mente dos jogadores, trazendo uma nova luz aos romances virtuais e possivelmente começando uma nova era para eles nesse lado do mundo.
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Imagem promocional de “Sucker for love” um romance virtual insano com uma criatura de outro mundo. Fonte: Steam